quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Hoje Rilke me fez pensar em algo que já havia pensado antes. Eu preciso escrever? Por que eu escrevo? Para responder a esses conflitos, preciso embriagar-me da mais pura solidão. Me fez lembrar também de uns versos que fiz há algum tempo mas vou deixar pra mais tarde e do que Rubem Alves me disse em outras palavras e eu já sabia: o âmago da arte é a dor. Não há poeta, ou qualquer artista que seja, sem inquietude, sem sofrimento.

Beethoven, por exemplo, no ápice da sua produção intelectual, a famosa “crise criativa” também estava no auge da sua dor, completamente surdo e mergulhado em problemas pessoais, internos e externos. O próprio Rilke foi infeliz desde a sua infância, devido a traumas familiares, solidão e conflitos emocionais, diversas doenças, a velha busca de um deus, e suas questões existenciais. Rimbaud, Cazuza, Van Gogh... tantos outros artistas, de tantos lugares e épocas estão fadados ao sofrimento em troca da produção artística.

Eu ando em busca de mim e do que me faz sofrer. Eu preciso escrever para sobreviver, para me sentir mais leve, para buscar e sentir a vida. Cansei de querer escrever para impressionar, para ser recompensado, para ser lido, criticado. Cansei de olhar para fora e esperar respostas, esperar um deus que nunca vem, ou a manifestação de um diabo pintado pelos homens. E só hoje eu vejo o quão tolo eu fui e quanto eu ainda sou.

Preciso escrever para me sentir, em mim, de mim, para mim, escrever para me satisfazer, para me esvaziar e me preencher. Preciso escrever para me renovar, morrer e renascer a cada letra que costuro as entre linhas. Preciso desenhar com palavras minhas próprias mentiras, fugir do medo, parir meu mundo. Preciso escrever para poder respirar, para poder existir, buscar razão na razão. Preciso escrever porque tenho tanto a dizer e sou incapaz de falar e ao escrever eu me desnudo do mundo, me transporto para outra estação, em que tento ser livre mas continuo sendo um copo vazio...

Complementando um post do passado:
“Uma obra de arte é boa quando surge de uma necessidade. É no modo como ela se origina que se encontra seu valor, não há outro critério.”

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Hoje minha cabeça está lotada

de pensamentos alheios
embaralhada
rodando sem órbita
Hoje eu poderia escrever sobre qualquer coisa
Sobre o orgulho e a vergonha de nascer brasileiro
Sobre a condição do cidadão perante a aplicação das leis
Sobre a incompetência no fazer valer nacional
Sobre a ignorância da manutenção da ordem
Sobre o desprezo da condição de ser humano
Sobre o abuso do poder em todas as escalas
Sobre o paradoxo liberdade, inocência
Sobre o caos que germinamos
Sobre a personalidade e os processos mentais
Sobre as crises existenciais e tal
Sobre qualquer coisa que eu copiasse da internet ou de um jornaleco local
Hoje eu poderia fazer qualquer outra coisa
Mas hoje eu prefiro


ficar em silêncio
livre
...

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Ultimamente estou meio intrigado e atordoado, portanto,
"não quero usar tantas palavras, nem lhes prender num sermão tão chato..."

Vou apenas transcrever um texto que gostaria de ter escrito, "Bar ruim é lindo, bicho", de Antonio Prata.

"Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso freqüento bares meio ruins. Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de cento e cinqüenta anos. (Deve ter alguma coisa de errado com uma vanguarda de mais de cento e cinqüenta anos, mas tudo bem).
No bar ruim que ando freqüentando ultimamente o proletariado atende por Betão – é o garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas, acreditando resolver aí quinhentos anos de história.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos ficar “amigos” do garçom, com quem falamos sobre futebol enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de literatura.
– Ô Betão, traz mais uma pra a gente – eu digo, com os cotovelos apoiados na mesa bamba de lata, e me sinto parte dessa coisa linda que é o Brasil.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos fazer parte dessa coisa linda que é o Brasil, por isso vamos a bares ruins, que têm mais a cara do Brasil que os bares bons, onde se serve petit gâteau e não tem frango à passarinho ou carne-de-sol com macaxeira, que são os pratos tradicionais da nossa cozinha. Se bem que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, quando convidamos uma moça para sair pela primeira vez, atacamos mais de petit gâteau do que de frango à passarinho, porque a gente gosta do Brasil e tal, mas na hora do vamos ver uma europazinha bem que ajuda.
Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, gostamos do Brasil, mas muito bem diagramado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer bar ruim. Tem que ser um bar ruim autêntico, um boteco, com mesa de lata, copo americano e, se tiver porção de carne-de-sol, uma lágrima imediatamente desponta em nossos olhos, meio de canto, meio escondida. Quando um de nós, meio intelectual, meio de esquerda, descobre um novo bar ruim que nenhum outro meio intelectuais, meio de esquerda, freqüenta, não nos contemos: ligamos pra turma inteira de meio intelectuais, meio de esquerda e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar ruim.
O problema é que aos poucos o bar ruim vai se tornando cult, vai sendo freqüentado por vários meio intelectuais, meio de esquerda e universitárias mais ou menos gostosas. Até que uma hora sai na Vejinha como ponto freqüentado por artistas, cineastas e universitários e, um belo dia, a gente chega no bar ruim e tá cheio de gente que não é nem meio intelectual nem meio de esquerda e foi lá para ver se tem mesmo artistas, cineastas e, principalmente, universitárias mais ou menos gostosas. Aí a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio intelectuais, meio de esquerda, as universitárias mais ou menos gostosas e uns velhos bêbados que jogavam dominó. Porque nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos dizer que freqüentávamos o bar antes de ele ficar famoso, íamos a tal praia antes de ela encher de gente, ouvíamos a banda antes de tocar na MTV. Nós gostamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que sabem subir em coqueiro e usam sandália de couro, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, de Chevette e chinelo Rider. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina a Vejinha, abomina mesmo, acima de tudo.
Os donos dos bares ruins que a gente freqüenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantêm o bar autenticamente ruim, chamam uns primos do cunhado para tocar samba de roda toda sexta-feira, introduzem bolinho de bacalhau no cardápio e aumentam cinqüenta por cento o preço de tudo. (Eles sacam que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar caro por aquilo que tem cara de barato). Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de lata por umas de fórmica imitando mármore, azulejam a parede e põem um som estéreo tocando reggae. Aí eles se dão mal, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa autêntica, tão Brasil, tão raiz.
Não pense que é fácil ser meio intelectual, meio de esquerda em nosso país. A cada dia está mais difícil encontrar bares ruins do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de chinelos Rider e a Vejinha sempre alerta, pronta para encher nossos bares ruins de gente jovem e bonita e a difundir o petit gâteau pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio intelectuais, meio de esquerda que, como eu, por questões ideológicas, preferem frango à passarinho e carne-de-sol com macaxeira (que é a mesma coisa que mandioca, mas é como se diz lá no Nordeste, e nós, meio intelectuais, meio de esquerda, achamos que o Nordeste é muito mais autêntico que o Sudeste e preferimos esse termo, macaxeira, que é bem mais assim Câmara Cascudo, saca?).
– Ô Betão, vê uma cachaça aqui pra mim. De Salinas quais que tem?"

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Desafogando

Semana passada, participei da final do festival de poesia da UFMA e não fui premiado. Não vou mentir dizendo que me bastava participar, é claro que eu não só queria ser premiado como vejo que tenho mérito para tal. Ainda assim, o 1º colocado necessitava bem mais do prêmio que eu, mas não merecia tanto. Não vou ficar me queixando, o que está feito, está feito. O ponto ao qual quero chegar é: como coloca sentimentos e idéias num pódio?
O artista sente e transmite - cada pessoa pode se identificar, gostar ou não. Como classificar Beethoven, Bach e Vivaldi? Peguemos a 5ª, Fuga em G e as Quatro Estações, qual é a melhor? Quais critérios podem utilizar para classificá-las num pódio? Várias pessoas podem não gostar de um ou gostar de outro, mas é ilegítimo dizer que um é melhor que outro. Assim como colocando Pessoa, Drummond e Rimbaud em um embate eu posso ter minhas preferências e afinidades, mas como eu vou classificá-los? É claro que estou falando de gênios imortais que ultrapassaram seu tempo.
Mas trazendo para a realidade atual, um júri técnico tem lá seus critérios, mas para ser técnico, não pode deixar sua subjetividade influenciá-lo, e agora? Qual a unidade da arte? Não há. Arte não pode ser julgada com legitimidade.
Entre Picassos e Michelangelos não há vencedor, entre meros mortais também não, mesmo que digam o contrário. Estamos fadados a ser julgados, avaliados, classificados, até o fim de nossas vidas, ou quase. Qualquer um pode perceber que um grande artista só é devidamente reconhecido próximo ou depois da morte.
Abaixo o poema do concurso, que lerei novamente dia 14 na 2ª feira do livro


Desafogo

A linha do horizonte
é tênua e árdua
é nosso matrimônio
Nos une e nos corta ao meio

A imensidão em nós se espelha
Morte e Salvação
Vida e Perdição
Começo e Fim

O horizonte nos reflete
Quem sou eu? Quem é você?
No fim não há diferença
A quem chegar, um troféu
De ouro, marfim, sal e algodão.

No caminho de casa, todos podem te ver
Na saída, querem tocar sem poder
Quanto mais perto, mais distante parece
Ao beijar-te no horizonte, sinto que estou livre.

Sinto nossa assimetria
De um lado, uma promessa
Do outro, uma dívida
Dos dois, uma dádiva - de quem não se sabe.

Sinto que podemos enganar a todos,
mesmo estando enganados

Calmos e Selvagens
O lobo e a ovelha
O mundo é o meu pastor
e tudo me faltará

E no fim, em ti acabarei
Com ou sem esperança
Com ou sem crença
Sem mágoa ou doença
e a pureza de uma criança

"Tudo vale a pena

Se a alma não é pequena"

.

E até a próxima quarta.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Escrever num blog é como fazer análise, um contato impessoal, sem restrição de desejos e fantasias, cada post um desabafo, cada comentário um laudo.
Da vontade de ser notado, ou se mostrar conhecimento ou qualquer baboseira.
Não precisamos, realmente, de um parecer de outrem, mas externar, no mínimo, algum sentimento para qualquer estranho perfeito ou espelho torto.
Estar sujeito a piadas ou "intelectuais polemizadores".
Por ser uma análise em praça pública, escrever num blog é se prostrar no meio da multidão e pedir pra ser apedrejado esperando ser cultuado.
E assinalar um compromisso consigo fingindo ser com outros, querer "alguém" em quem desabar suas desventuras e acasos diários.
Ou simplesmente um lugar onde se tem liberdade sem a preocupação em ser censurado, apenas em ser criticado, que pode doer mais que a censura, dependendo do caso, e não deixa de ser como fazer análise.
Escrever faz sofrer
Sofrer faz escrever
Não lembro bem a ordem da história e nem se altera em algo, sei que pensar demais é angustiante e me prendo a canções. E me liberto em canções, cada palavra em mim é um grilhão que ao ser escrita se rompe.
Escrevo num blog porque não sei falar.

"Vou me encontrar longe do meu lugar"

.